Depois de 24h de viagem, já começa a bater o cansaço e o desânimo. A emoção da parada em cada vila vai diminuindo. A cada uma (e são muitas) a paisagem se repete, crianças e vendedores. Tirei tanta foto que fiquei com o dedo doendo. Mas uma coisa me chamou a atenção ainda na Zâmbia. Claro, as vilas pelas quais passamos, são pobres, muito pobres. A aparência das pessoas refletem isso, embora algumas mulheres com mantas coloridas tenham até uma certa elegância. As crianças especialmente, andam com roupas maltrapilhas, muitas descalças, embora não aparentem subnutrição. Brincam à nossa frente e tem sempre um sorriso de alegria. Numa dessas vilas, me chamou a atenção algumas delas, já maiores, que iam para a escola, muito bem vestidas. As meninas de saia azul marinho, camisa e meia brancas, com sapatos pretos impecáveis, roupa de normalista. O rapaz idem, só que de calças, claro. A julgar pela aparência dos jovens, existe preocupação com a educação. Gostei.
Meninos na Zâmbia
E a menininha carregando o irmão.
Apesar das diligências da Obbiggah, a nossa camareira, o ambiente no trem vai se degradando com o tempo. Os banheiros que já eram ruins, ficam imundos. O pó que entra pelas janelas vai se acumulando. Banho? Pensei que não tinha, mas depois da segunda noite de sono, descobri um chuveiro. Mas acho que mesmo que soubesse, dispensaria.
A camareira Obbiggah
Na Tanzânia a paisagem muda. Aparecem vales e montanhas, o que faz o trem balançar mais. Não me tirou o sono nem um pouco. Pontualmente às 20h do segundo dia, após o jantar (mesmo cardápio), dormi e fui direto até as cinco da manhã. Fui acordado pelos meus companheiros de quarto para ver o 'Kilimanjaro'. Não era possível, mas mesmo assim, acordei e sai correndo para fotografar.... uma 'montanhinha' ao lado da qual o trem passava. Mico! Mas os dois eram simpáticos, alegres e muito prestativos. Um deles, uma certa hora me fez uma proposta indecente: trocar minhas legítimas havaianas pelas duvidosas zambianas dele. Achei muita folga, mas topei. Ele merecia. Só não sei como faria para por seu pé 44 na sandália 41. Mas ele ficou contente. Pode ver na foto.
Evans e Francis. Para as moças não reclamarem que no Blog só tem mulher. O primeiro levou a sandália.
O tempo passa, mais fotos e cada vez mais gente assediando o trem. Também pudera, a população da Tanzânia é o triplo da de Zâmbia. Aumenta também a diversidade de iguarias oferecidas aos passageiros.
Vendedoras de bananas
O meu café da manhã só foi servido às 10:30, apesar das reclamações. Dois ovos, duas salsichas, duas fatias de tomate e café por módicos U$ 2. Matada a fome, tirei um cochilo, quando fui acordado por uma verdadeira histeria do lado de fora da cabine: “animals, animals!!".
Levantei correndo, peguei a máquina e fui para a janela do trem. Primeiro um bando de gnus e depois antílopes. Fotografei freneticamente, mas para meu desespero, tinha acabado a carga da máquina. Voltei para a cabine, troquei as pilhas e fiquei mais uma
hora plantado na janela esperando ver elefantes, leões ou qualquer 'Big Five'. Nada. Um macaquinho aqui, um veadinho ali...
Mas a essa decepção somou-se uma alegria. Uma intermitente garoa assolou o trem desde a sua entrada no Parque Selous. Será o fim da grande seca pela qual a África atravessa?
Não é comum, mas o trem chegou em Dar es Salam no horário. Tinha cinco objetivos imediatos: chegar num hotel, tomar um banho, achar uma internet, fazer uma refeição decente e dormir numa cama. Completei o terceiro.